sexta-feira, 11 de maio de 2012

Caminho Primitivo: Dia 8 (21 de Abril: Castroverde - San Roman de Retorta)


Transformámos esta etapa naquilo que designa de " duas em uma"! Os guias apontavam para 42 km, mas o gps do Manuel Correia marcou 46,3 km! Fica a duvida! Mas certo é que foi o dia que andámos mais! Ganhámos 1 dia, mas sobraram mazelas! Saímos de Castroverde às 07h35 da manhã e de novo com chuva, que nos acompanhou até muito perto de Lugo! Pelo meio efectuámos 2 paragens para aliviar a bexiga, beber água e ajustar a carga! Às 12h30 e após algum tempo de aproximação chegámos à imponente cidade de Lugo, a maior depois de Oviedo! Gostei da fortaleza da cidade, com as muralhas e as torres em muito bom estado, a merecer umas fotos a preceito! Uma catedral imponente que, por contingências relativas à grande extensão da etapa, não visitámos por dentro! Almoçámos todos juntos já na saída da cidade na Tasca da Calzada, ementa completa por 10 euros! E em boa hora o fizemos, pois julgo que foi decisiva esta pausa para retemperar forças que nos encheu de ânimo e de calorias para enfrentar os cerca de 20 km que ainda tínhamos pela frente! Como não tinha carimbado a credencial na catedral de Lugo, aproveitei para a carimbar onde almoçámos! A 1 km do destino parámos na Taberna do Rodrigo para saborear uma bebida! O Rodrigo quis saber como estava Portugal face à crise! Às 19h30 chegávamos a San Roman de Retorta, a tarde esteve boa e sem chuva, o que também ajudou à travessia! Ficámos no albergue Privado O Cândido. Tinha todos os serviços, lá jantámos também e tomámos o pequeno-almoço na manhã seguinte! Só não correu muito bem a questão da roupa, pois não enxugou grande coisa, uma vez que a salamandra se apagou durante a noite! Como já disse foi uma jornada que deixou marcas, a mim calhou-me em sorte uma inflamação no tendão de Aquiles do pé direito, qualquer coisa próxima de uma tendinite! Anti-inflamatórios e uma boa pomada conseguiram debelar males maiores! Antes de recolher ao quarto, ainda "passei pelas brasas" junto ao saboroso lume que ardia na salamandra, refastelado num sofá, com o Castro por companhia que também dormitou! Confesso que quando o Pimpão nos acordou nem sabia onde estava, tal era o cansaço! 

Fotos (autoria): António Delfino e Manuel Correia

quinta-feira, 10 de maio de 2012

Caminho Primitivo: Dia 7 (20 de Abril: Padron - Castroverde)


Demos inicio à jornada às 07h30 da manhã! Em Vilardongo, ao chegarmos à estrada principal, deixámos de ver as setas do Caminho. Eu seguia com o Delfino, os outros seguiam um pouco mais à frente. Avistámo-los  a subir um pouco acima de nós e a certa altura interroguei-me como apanhar aquela direcção seguindo pela estrada, pois não tínhamos indicação para mudar de sentido. Voltei atrás para confirmar se não nos tinha escapado nenhuma seta, tarefa que não foi fácil, pois a chuva recomeçou a cair, até já estranhávamos quando tal não acontecia! Confirmei que não havia seta alguma para sair da estrada e quando cheguei onde o Delfino tinha ficado ele já lá não estava! Tentei telefonar-lhe sem sucesso dado que ele não tinha rede onde se encontrava! Presumi que tivesse seguido pela estrada, pois dissera-me momentos antes, quando notámos a falta de setas, que seria o melhor caminho a seguir. Pois decidi também continuar pela estrada até à próxima povoação e perguntar se estava no caminho certo! Foi o que aconteceu, bati à primeira porta que encontrei na povoação logo a seguir a Vilardongo (que não fixei o nome...) e um senhor muito simpático confirmou-me que estava no Caminho certo, continuando pela rua onde estava apanharia logo as setas! E assim aconteceu! Mais tarde vim a comprovar pelo guia que o Caminho seguia pela estrada, a seguir a Vilardongo, durante 2,6 km até entrar de novo em terra batida! Ainda assim penso que deveria estar melhor sinalizado naquele troço, mas admito que nos tenha escapado alguma seta, pois com a chuva e a pouca visibilidade, poderia muito bem ter acontecido! Faltava agora localizar o Delfino! Decidi voltar a telefonar-lhe onde me conseguisse abrigar da chuva, foi nesta fase que passei por um troço do Caminho autêntico rio, quase de águas bravas, com o telemóvel numa mão e o bastão na outra, não aterrei por milagre, não resisti a gritar raios e coriscos! Quando dei por mim estava noutro "pueblo", tudo aldeolas muito pequenas! Liguei ao Delfino e consegui, finalmente, chegar à fala com ele! Estava no Caminho que, tal como eu, o tinha apanhado pela estrada, mas pela localização que me deu (junto a uma capela...), estava à minha frente, pois não lembrava de ter passado por nenhuma capela! Disse-me que esperava por mim! E não esperou muito tempo! Minutos depois, num caminho em ascenso avistei a dita capela lá no alto! Estava junto a um antigo albergue que tinha sido recuperado para abrigar peregrinos em caso de mau tempo, tinha um espaço envolvente muito interessante e muito bem recuperado! Fizemos um ponto de situação da nossa inesperada aventura matinal e retomámos o Caminho! Em Paradavella, no bar Mesón, entrámos para comer algo e carimbar a credencial! Seguimos à risca as recomendações do seu simpático proprietário para que, nos próximos 4 km até A Lastra, seguíssemos pela estrada porque o Caminho estava intratável! E assim fizemos! A Pilar e a Viveca também já estavam a comer neste bar quando nós chegámos, o Jacob chegou pouco depois de nós! Os outros tinham aqui passado mais cedo e o Mesón ainda estava "cerrado"! Em Fontaneira parámos na Casa Bortelon que tinha um ambiente bastante acolhedor, uma lareira fechada que aquecia todo o espaço! Que bem que nos soube "fugir", nem que fosse por alguns minutos, da chuva e do frio! Pouco depois chegou o Jacob! Bebemos "canhas" e comemos tapas oferecidas pela casa! O bar tinha uma enorme colecção de notas de diversos países, Portugal incluído! O Jacob sacou de uma nota da República Checa (que nos disse que vali 4 euros...) e ofereceu-a ao dono do Bortelon e passou a integrar também a já vasta colecção! Passámos em Càdavo Baleira às 14h55! A Pilar e a Viveca ficavam por aqui, quanto ao Jacob não tínhamos bem a certeza! Chegámos a Castroverde às 16h55, já com menos chuva e com o sol a espreitar de quando em vez! Optámos por não ficar em Vilabade, uma vez que não era certo que a Casa de Turismo Rural estivesse a funcionar em pleno, ficámos mais à frente, o que sempre encurtaria (a já extensa etapa seguinte...). Ficámos no Hostal Cortez por 19 euros por pessoa (o alojamento mais caro de todo o Caminho...), não foi uma boa relação preço/qualidade, já para não falar nas deficientes condições em que tomámos banho, mas atendendo a que não havia mais nada nas imediações, foi o melhor que se pode arranjar! Em compensação valeu o final de tarde e principio de noite no bar da praça central de Castroverde, onde a simpática empregada de nome Nieves nos brindou com umas canhas e nos ofereceu diversas tapas! Subimos ao 1º andar para jantar, a sala e o simpático cozinheiro por nossa conta! Desfrutámos, entre outros pratos, da melhor sopa de marisco que já alguma vez comi! Uma sopa recheada de variado marisco! Excelente! Foi um pouco mais caro do que o menu normal, mas valeu bem a pena! Percorreram-se 32,5 km! Ah! Já me esquecia o Delfino e o Leonel compraram roupa ainda durante a tarde, acho que as mochilas estavam a ficar leves de mais, havia que compensar, eh..eh..eh...!

Fotos (autoria): Manuel Correia e António Delfino

quarta-feira, 9 de maio de 2012

Caminho Primitivo: Dia 6 (19 de Abril: Castro - Padron)


A saída ocorreu um pouco mais tardia que o habitual, às 08h35, uma vez que o pequeno-almoço foi servido apenas a partir das 08h00 da manhã, o que não foi, particularmente, uma fatalidade, pois a etapa até Padron não iria além dos 24 km. O dia esteve bem mais agradável que o anterior, ainda que tivesse chovido a espaços. Voltamos a subir acima dos 1000 metros de altitude, contudo já estávamos a uma cota considerável, pelo que não se notou muito o desnível. Subimos precisamente até aos 1.100 metros no local denominado Puerto Del Acebo, fronteira entre as Astúrias e a Galiza, momento que registámos para a posteridade com a foto da praxe! Às 11h00 da manhã parámos para retemperar forças no único bar de Puerto Del Acebo, tomámos 2 copos do tinto e comemos umas tapas. Aproveitámos também para carimbar a credencial oficializando assim a nossa entrada na Galiza! Às 14h30 e após uma subida com uma distância e inclinação consideráveis, chegámos a A Fonsagrada, uma vila também de grande dimensão! Após algumas hesitações e pedidos de informação, almoçámos no restaurante “Prados”! Estávamos a necessitar de comer em condições e desfrutámos do 1º almoço digno desse nome do Caminho Primitivo! A ementa foi composta por uma canja que aqueceu o corpo e o espirito, uma filete de ternera (vitela) do melhor que já comi, tarte de Santiago, café “solo” e “chupito” de aguardente “blanca”! Tudo isto por 9 euros por pessoa! Maravilha! Deixámos gorjeta à simpática empregada! Mais tranquilo e reconfortado trilhei, na companhia do Delfino, os 1.700 metros que nos separavam do albergue de Padron. Encontrámos o Rosalino Castro e a Pilar que também tinham almoçado em Fonsagrada. Registámo-nos no albergue, que pertencia à Proteção Civil, às 16h15. A máquina de cerveja e de snacks teve que ser reforçada mais do que uma vez (mais de cerveja do que de snacks, eh!eh!eh!)! Às 20h00 desfrutámos de um verdadeiro jantar comunitário que teve uma mãozinha especial do Rosalino Castro! Todos contribuíram com o que tinham e no final resultou uma refeição e peras! Neste jantar participaram todos os que tinham estado no albergue de Castro, mais um peregrino francês (de Tours), o François, com o qual já nos havíamos cruzado em Puerto Del Acebo e A Fonsagrada! Após a janta assistimos ao jogo de futebol entre o Sporting e o Atlético de Bilbao para a Liga Europa (que o Sporting viria a vencer por 2-1). Pudemos ver o jogo graças ao Javi (o amigo do Pepe) que tinha ligação à net através da sua tablete! Mas nem todos assistiram ao jogo, houve que não aguentasse a pressão e fosse para a cama mais cedo, e mais não digo! Chegaram já mais tarde 3 peregrinos espanhóis!

Fotos (autoria): António Delfino e Manuel Correia

terça-feira, 8 de maio de 2012

Caminho Primitivo: Dia 5 (18 de Abril: Berducedo - Castro)


Após uma noite de sono muito tranquila e de merecido descanso, graças ao facto de termos ficado com um dos pisos do Albergue Privado “Caminho Antigo”, exclusivamente por nossa conta, por apenas 15 euros cada um, lá nos aprontámo para sair do albergue, pelas 08h05 da manhã, já com uns bolitos e uma garrafa de leite com chocolate nos estômagos em jeito de “desayuno” quase volante. O pessoal que tinha ficado no albergue municipal já tinha passado cerca de 10 minutos antes. Com eles seguiam o Javi, a Pilar, a Viveca e o Jacob! Ainda estava bem fresca na nossa memória a aventura do dia anterior pela Variante dos Hospitais, era inevitável não se pensar nela! 

E não pude deixar de imaginar o que teria sido fazê-la com tempo limpo, decerto teríamos visto com mais deleite os cones e escarpas com enormes encostas até perder de vista, que devido ao denso nevoeiro não nos foi permitido contemplar! Troços de impor respeito que, devido à pouca visibilidade, nos passaram muito despercebidos! Embrenhados nestas divagações da mente, quase nem nos demos conta da prolongada subida por estrada, logo depois de Berducedo. A chuva tocada a vento forte começou a açoitar! Já perto de “A Mesa” cruzámo-nos com um casal de peregrinos espanhóis que, a espaços, nos fizeram companhia até à Barragem de Grandas de Salime! No trilho em descenso até à Barragem juntaram-se a mim e ao Defino, o Javi e a Pilar! Sempre pensámos que estariam na nossa frente!

O Javi estava com bastantes dificuldades físicas, ao nível dos joelhos e nos pés já com algumas bolhas que já tinham sido tratadas pelo Castro! Deu-nos a entender que seria difícil a sua continuidade no Caminho! Ficámos um pouco apreensivos e constrangidos, confesso! Era o nosso “velho” companheiro Javi, e o Javi não era um amigo qualquer! Em termos paisagísticos não resisto a destacar todo o caminho de acesso ao trilho de descida até à barragem, com enormes abetos de um e de outro lado e com o rio Navia a surgir no horizonte!  O trilho que desce até à Barragem é também ele muito bonito, no entanto exige algum cuidado, com uma caminhada mais técnica em virtude da grande quantidade de folhas de castanheiro prostradas no chão e que não deixavam ver o que estava por baixo! O “embalse” de Grandas de Salime, o rio Navia e toda a sua a paisagem envolvente foram, sem duvida, os pontos fortes desta etapa a solicitarem umas fotografias a preceito, com destaque para as que foram tiradas no e do miradouro da barragem! 

Só a chuva teimou em permanecer, tirando algum brilho à reportagem fotográfica! Pouco depois do início da subida, a seguir ao “embalse” fizemos uma pausa no bar do hotel Las Grandas para repousar um pouco e meter alguma coisa na barriga, carburante para o que ainda faltava até Castro! Neste bar estavam alguns turigrinos franceses com quem já nos tínhamos cruzado depois de Berducedo, seguiam com carro de apoio. Às 15h00 chegámos a Grandas de Salime, a maior vila por que tínhamos passado desde Tineo! Aproveitei para levantar dinheiro, a 2ª vez desde Oviedo! Não foi tarefa fácil despir a capa e a mochila, pois a chuva estava teimosa e ainda por cima caixa multibanco não tinha cobertura! Na saída de Grandas bebemos café e brandy para aquecer o corpo e o espirito! Os 2 km finais até Castro foram feitos por um caminho, que de caminho só tinha o nome, seria melhor chamar-lhe piscina, tal era a quantidade de água que caíra por ali! Chegámos ao albergue juvenil de Castro às 16h30, 32,3 km depois de Berducedo, debaixo de muita chuva, que não deu uma única trégua em todo o dia! Terminava a pior de todas as jornadas em termos de condições metrológicas adversas, decididamente!

O hospitaleiro facultou-nos o acesso um anexo junto ao albergue, onde nos pudemos livrar da roupa da chuva e das botas! Não resistimos a praguejar alguns impropérios à maldita intempérie! Não havia maneira de S. Pedro e de Santiago se entenderem! Raios! Foi mais uma etapa, como diriam “nuestros hermanos”, “rompe piernas”! Com um sobe e desde constante! Partilhámos um excelente jantar peregrino, onde marcaram também presença, para além do habitual grupo, 2 peregrinos de Barcelona, que se chamavam Pepe e Javi! A ementa constava de sopa de feijão, frango e “chipirones” (chocos)! De tarde já tínhamos desfrutado de uma variada coleção de cervejas, acompanhada de um delicioso presunto com azeite! Tudo isto no albergue! Os nossos receios em relação ao amigo Javi Mayor vieram, infelizmente, a confirmar-se! Estava muito debilitado fisicamente e decidira regressar a casa, via Grandas de Salime, na manhã seguinte! Terminaria o Caminho logo que lhe fosse possível! Deixou a sua capa ao Manuel Correia! Foi uma despedida geral muito sentida, com era de esperar!   

Fotos (autoria): António Delfino

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Caminho Primitivo: Dia 4 (17 de Abril: Borres – Berducedo, pela Variante dos Hospitais)


Saí do albergue de Borres, na companhia do Leonel, com mais esperança do que convicção, de que o tempo permitisse uma subida tranquila pela Rota dos Hospitais, que permitisse desfrutar da etapa rainha do Caminho Primitivo, por assim dizer! Eram 08h00 da manhã quando, a pouco e pouco, começámos a deixar para trás Borres e a ir ao encontro da montanha! A alternativa pela Rota dos Hospitais iniciou pouco depois de Borres e estava devidamente sinalizada com um marco e uma placa. Em boa verdade decidimo-nos por esta via, sem certezas sobre as condições meteorológicas que estariam lá no alto, mas sabíamos que, pelo menos, havia neve! Mais tarde soube que perguntaram a um velhote que andava a passear os cães, se havia muita neve lá no alto ao que o senhor respondeu que não havia! Pois, pudera, até onde ele tinha ido se calhar não havia! Eh!Eh!Eh!

Bom, é verdade que sonhámos durante bastante tempo com esta etapa, e não podíamos desistir dela assim de ânimo leve e sem um forte motivo! Pelo que todo o grupo: os 7 portugueses, o Javi, a Pilar, a Viveca e o Jacob, decidiu subir atravessando a variante dos Hospitais! Digamos que assumimos o risco, mas ainda assim um risco calculado! A parte inicial foi pacífica com o ascenso a progredir de forma gradual! Mas, logo depois e à medida que íamos ganhando altitude, o vento começou a soprar com fortes e gélidas rajadas, numa fase em que apenas se vislumbrava um salpico ou outro de neve. Após termos passado por La Paradiella e por Valla Amarilla e antes do primeiro ascenso digno desse nome, tocou, nos nossos sentidos, o primeiro sinal de alarme, foi precisamente junto às ruínas do primeiro hospital (albergue) denominado Paradiella, que o vento fustigou sem pedir licença, era forte e gélido! Nesta fase eu seguia na cauda do grupo com o Delfino, parámos para nos agasalharmos como exigiam as condições atmosféricas que ali se faziam sentir! Foi uma pausa de pouco mais de 5 minutos, ao longe avistámos alguns elementos do nosso grupo a iniciar o primeiro patamar de subida! 

Retomámos a marcha preparados a rigor para o frio e para o vento, ou antes se preferirem, para o vento frio e forte! Passámos por uma manada de vacas que acudia aos brados dos seus tratadores que lhes deitavam ração pelo chão. Lembro-me de pensar como era possível aqueles animais aguentarem aquelas condições adversas, mas não eram os únicos, um pouco antes já tínhamos passado por uma manada de cavalos que vagueava acima e abaixo por aquelas agrestes encostas! Ultrapassada com sucesso a primeira subida digna desse nome, começou a surgir mais neve e o vento parecia começar a fustigar de todos os lados! O nevoeiro baixou sem qualquer aviso, ou melhor já ali se encontrava, e engolia-nos à medida que ganhávamos altitude! A neve começou a surgir mais amiúde e deu para ver que era recente, pois estava fofa e cedia à nossa passagem. Fomos seguindo as pegadas dos que nos precediam e de facto isso veio a revelar-se uma vantagem para nós, pois evitámos pisar muitas vezes em terreno falso! Sem quase darmos por isso entrámos no epicentro da tormenta, numa mistura de vento forte e frio, com nevoeiro e alguma chuva gelada e, para ajudar à festa, com imensa neve no solo!

De quando em vez o dia parecia querer clarear, era o sol a tentar desesperadamente furar, sem sucesso, o denso nevoeiro! Não vos consigo descrever as sensações que me assolaram, a adrenalina estava ao rubro, os sentidos todos alerta e invadiu-me uma força e uma energia que nunca antes tinha sentido! Em 13 anos a calcorrear a penantes “seca e meca”, esta era de facto uma travessia que iria perdurar eternamente! Por isso havia que estar ao nível da sua exigência! Fomos progredindo com a serenidade possível, mas sem nunca vacilar! Ao chegarmos às ruinas do segundo hospital (albergue) denominado Fonfarón, o vento amainou subitamente! Por momentos pensámos em entrar, mas o chão deste antigo albergue estava cheio de água. Aproveitámos a trégua do vento, para aliviarmos as bexigas, para beber água e comer uma barrita. Mais à frente e após passarmos pelas ruínas do antigo hospital de peregrinos de Valparaíso, continuamos a marcha em direção ao Alto de La Marta (1.105 metros de altitude), atravessámos a estrada para nos embrenharmos de novo pela montanha! 

Foi o derradeiro round do confronto entre o homem e a força da natureza! Quase sem darmos por isso chegávamos ao Puerto Del Palo (1.146 metros de altitude), no entanto fiquei com a ideia que já tinhamos estado em locais de maior altitude, sensação que veio a confirmar-se como facto, um pouco mais tarde pelo gps do Manuel Correia que registou 1.285 m ainda antes do Puerto Del Palo! Registámos fotograficamente o que foi possível, incluindo a chegada ao Puerto Del Palo! Quando iniciámos o descenso (e que descida…!) que nos haveria de levar até Montefurado, estávamos com uma sensação de dever cumprido! À medida que desciamos e íamos perdendo cota, o vento amainava e o nevoeiro ía dissipando, mas a chuva teimava em permanecer! Para nós, pelo menos para mim, tinham sido simultaneamente os 14 km mais terríveis, mas também os mais fantásticos que alguma vez havia percorrido! Aquilo que à partida nos deixara mais apreensivos, o desnível acumulado de mais de 650 metros de altitude, veio a verificar-se que, afinal, tinha sido o menor dos nossos problemas! Ao chegarmos a Montefurado conseguimos finalmente avistar o nosso pessoal, desde o primeiro hospital que não os avistávamos! 

Tinham feito uma pausa para descansar, para se abrigarem da chuva e para comerem algo! Mais tarde soube que o grupo se dividiu em três partes e que o pessoal da frente chegou à povoação de Lago com mais de 1 hora e trinta minutos de avanço do segundo grupo!? Foi aqui que eu e o Delfino efetuámos também uma prolongada e merecida pausa! Às 17h45 chegámos a Berducedo, debaixo de chuva para variar. O albergue municipal já estava completo, pelo que nós continuámos até ao albergue privado denominado “Camino Antigo” e em boa hora o fizemos! Ficámos os 2 instalados condignamente, “solos” e com cozinha à nossa disposição! Casa de banho só para “nosotros”, enxugámos roupa, enfim, deu para algumas mordomias que nesse dia, e tendo em conta o rigor da etapa, nós agradecemos muito! Como em Berducedo não havia restaurantes eu, o Delfino e o Ramos comemos tortilha de jambon regada com um tinto Rioja, café e xupito! De seguida fomos ter com o resto da “tropa” a um bar onde já tínhamos estado durante o final da tarde, assistimos ao Bayern de Munique – Real Madrid, comprámos uma sopita instantânea para comer à deita no albergue e comprámos também o pequeno-almoço da manhã seguinte. Foi uma etapa de 26 km, de emoções muito fortes, mas que, feitas as contas, valeu bem a pena! Uma ultima nota para endereçar os meus  sinceros parabéns a quem sinalizou a Rota dos Hospitais! Um trabalho de grande qualidade e que merece ser exaltado!  

Fotos (autoria): António Delfino e Manuel Correia