quarta-feira, 8 de setembro de 2010

A História de Pedro e Jacomina (III)

Antes do romper da aurora, já o bom do padre Bernardo se encontrava a braços com os preparativos para o pequeno-almoço dos seus hóspedes. Comovia-o saber o que aqueles bem aventurados peregrinos já tinham percorrido para ali chegar e mais que tudo isso, o que ainda tinham que percorrer até estarem frente a frente com o túmulo do Apostolo S. Tiago. Era seu dever, como representante do Supremo na terra, bem receber todos aqueles que se aventuravam a percorrer o Caminho Santo. Quando o padre Bernardo assomou à sacristia, já Pedro, Jacomina e Joachim se tinham levantado, desfizeram-se em agradecimentos quando viram a bandeja que ele trazia com leite de cabra fresco, pão de milho, mel e compota de castanha! Enquanto comiam, trocaram algumas impressões sobre a nova jornada que se avizinhava, o padre quis saber onde tencionavam terminar o dia, ao que Pedro respondeu num português aceitável “…que costumavam andar 5 a 6 léguas por dia…, e que contavam começar já a caminhar para norte.”. O padre fez as contas mentalmente e disse-lhes que “… o mais provável era irem pernoitar em Nissa”. Dito isto, começaram a preparar os alforges, reabasteceram as cabaças de água e levaram ainda como oferta do simpático cura, figos secos e amêndoas de casca. O sol começava já a despontar quando Pedro e companhia transpuseram as portas do castelo de Vide. O dia amanhecia com algum frio e céu limpo, o que fazia antever uma jornada solarenga com a primavera a espreitar, o que também era notório pelas árvores que começavam a florir. Já tinham percorrido um pouco mais de 2 léguas, quando avistaram uma povoação que, fazendo fé nas indicações do padre Bernardo, deveria ser Alpalham, destacando-se à distância a imponente torre sineira da igreja e o castelo. Ainda ponderaram passar pela povoação, mas como estavam bem de provisões e de água, decidiram continuar para norte. Um par de horas adiante e quando, pela posição do sol, lhes pareceu ser boa altura para almoçar e descansar, começaram a refrear o passo e a olhar em redor, procurando um local para abancarem. Não demorou muito tempo até avistarem um sítio que lhes pareceu bastante aprazível, saíram do Caminho na direcção pretendida. Era um espaço fresco e sombrio que albergava uma fonte com uma bica em pedra por onde jorrava uma água límpida e fresca. A água corria para uma pia também ela de pedra, junto à qual existiam 4 pinos em granito. Após se terem refrescado, sentaram-se nos pinos e tiraram alguma comida dos alforges que dividiram entre si. Enquanto descansavam pés e pernas e saboreavam a comida, não puderam deixar de contemplar com algum deleite, a paisagem que os rodeava. Repararam que ao longe pastava uma enorme manada de vacas sob o olhar atento dos vaqueiros no alto das suas montadas. De volta à realidade Pedro, Jacomina e Joachim puseram-se em pé e voltaram a colocar às costas os alforges, agora um pouco mais leves. Encheram as cabaças da fresquíssima água da fonte e começaram a percorrer as quase 3 léguas que ainda faltariam até Nissa. Foi pouco de pois de terem reiniciado a caminhada que tudo aconteceu! Vindos do nada, surgiram de repente à sua volta 3 indivíduos montados em azémolas, pareciam estar a gozar a cena e os seus semblantes inspiravam pouca confiança. Apearam-se das respectivas montadas e sem mais delongas puxaram de facas e ameaçaram Pedro e Joachim ordenando-lhes que esvaziassem os alforges. Quando viram que apenas continham restos de comida e agasalhos, os rostos dos meliantes começaram a ficar carregados e num ápice passaram da pura indiferença à fúria iminente. Nisto voltaram-se para Jacomina e esta percebendo de imediato o que queriam, sacou do seu alforge e esvaziou-o para o chão, o conteúdo era igual. Foi a gota de água…, os bandidos constantando furiosamente que os peregrinos não tinham dinheiro, perderam a cabeça e de facas em riste retiraram os cajados aos peregrinos, de seguida o que parecia ser o chefe do bando começou a dirigir-se a Jacomina com um olhar de volúpia e de gozo, Pedro e Joachim constando de imediato as intenções do meliante saíram em defesa da sua companheira, mas sem sucesso, os outros 2 bandidos de cajados em punho e percebendo a jogada, assentaram-lhes, primeiro, uma cajadada no estômago e quando Pedro e Joachim caíram de borco uivando de dor, assentaram-lhes outra cajadada na nuca..., depois vieram as trevas!

Imagem:http://www.eb23-castelo-maia.rcts.pt/fotos_feira_medieval/peregrinos.jpg