terça-feira, 31 de agosto de 2010

A História de Pedro e Jacomina (II)

Ao romper da aurora, Jacomina, a primeira a acordar, sacudiu suavemente os seus companheiros de caminhada que de imediato acordaram e se puseram em pé. O dia não tardava a nascer pelo que era chegada a hora de se porem novamente ao Caminho. A hospitaleira, talvez ainda sensibilizada pela maquia oferecida por Pedro, já lhes tinha preparado um pequeno-almoço digno da realeza: leite fresco, mel, pão, chouriço e ovos fritos! Era imperativo retemperar forças para mais uma jornada que se avizinhava, no entanto, o manjar era pródigo em qualidade e quantidade, tanto assim que sobejou uma generosa parte que os peregrinos, irmãmente, dividiram pelos respectivos alforges. Estragar não era grandeza, muito menos numa situação como aquela! Após os votos fervorosos de “Buen Camino” por parte da simpática hospitaleira, lá partiram de novo Pedro, Jacomina e Joachim com Santiago da Galiza no pensamento. A manhã estava fria com um sol que, a pouco e pouco e algo tímido, lá ía começando a dar um ar da sua graça. Por volta das 10h00 chegaram à fronteira com o reino de Portugal. A presença de tropas de um e de outro lado da raia era notória, pelo que Pedro e companhia tiveram que dizer ao que vinham quer aos castelhanos e muito em especial aos portugueses. Qualquer uma das milícias logo sossegou ao ver a indumentária dos viandantes: alforge, cabaça com água, vieira ao pescoço e respectivo cajado de madeira, era inevitável que se dirigiam a Santiago da Galiza! Ainda assim não se furtaram a algumas perguntas da praxe. Os peregrinos alemães falavam algum castelhano e muito pouco de português, mas notaram que a pronuncia era muito parecida, pelo que o entendimento foi mais fácil do que o previsto. Já em território português e após cerca de 1 hora de caminho, já depois de terem passado a fronteira, pararam à sombra da copa de um enorme castanheiro, sob a qual existia uma fonte de mergulho com uma água fresca e cristalina, era o sítio indicado para comer e descansar um pouco. Já tinham percorrido mais de 2 léguas e ainda tinham pela frente outras tantas e mais quase 2 até “Castel da Vide” onde tencionavam pernoitar no final da jornada. Retomaram o caminho já o sol perdera a timidez inicial, parecia agora querer aquecer um pouco mais à medida que ia subindo no horizonte. Aqui e acolá lá se iam cruzando com alguns aldeões que arduamente trabalhavam as terras circundantes ao seu percurso. A pouco menos de 2 léguas do destino efectuaram nova paragem junto à povoação de “S. Salvador do Mundo da Aramenha”. Uma vez mais saciaram a sede e a fome e reabasteceram as cabaças de água do poço comunitário da povoação. Não resistiram a fechar um pouco os olhos, qualquer momento era precioso para descansar. O grito de um almocreve que conduzia uma parelha de bestas trouxe os nossos peregrinos de volta à realidade. Os animais pareciam não querer obedecer e o recoveiro ripostava. Rindo-se entre dentes do espectáculo, lá se puseram de novo ao Caminho. Foi com o sol quase a pôr-se no horizonte que Pedro e companhia avistaram a fortaleza da povoação de Vide, imponente lá no alto! Pouco tempo depois estavam às portas do Castelo, falando com as 2 sentinelas que, após se aperceberem que eram peregrinos que iam para a Galiza, lhes franquearam a passagem, dando-lhes indicação para se dirigirem à Igreja de S. João Batista onde lhes seria concedido albergue por uma noite. Chegaram mesmo à hora em que principiava a celebração da eucaristia, aproveitaram, por isso, a oportunidade para por “as contas em dia” com a Divina Providência e com Santiago de Compostela também! Concluída a missa apresentaram-se ao cura dizendo ao que vinham, este com um ar cansado pela idade avançada, mas um com um sorriso que iluminou os corações dos nossos peregrinos, conduziu-os até à sacristia, onde poderiam lavar-se e pernoitar. Mais tarde o pároco lhes traria provisões para a janta. Os aposentos não se podiam comparar com os da noite anterior, mas tinham sido oferecidos com a Graça de Deus, pelo que só tinham que estar agradecidos ao Supremo por uma vez mais terem tecto e comida! Logo após as trindades, o cura trouxe sopa quente de feijão com couve e chouriço cozido, pão, água, vinho e fruta. Jantaram os quatro em comunhão, o cura fez questão de partilhar o repasto com os bens aventurados peregrinos. Antes de recolherem para dormir, o pároco ofereceu-lhes ainda chá de poejos e despediu-se até à manhã seguinte. Pedro, Jacomina e Joachim rezaram em conjunto, demostrando a sua eterna gratidão pela forma generosa como , uma vez mais, tinham sido recebidos, pois só assim estariam em condições de enfrentar nova jornada rumo ao túmulo do Apostolo Santiago Maior!

Imagem: www.elcaminoasantiago.com/.../planificacion.htm